Com a propagação do coronavírus, e o decreto feito pela Organização Mundial da Saúde (OMS) de pandemia, os serviços foram abalados de diversas formas e, com a logística internacional, não foi diferente.
Com os lockdowns mundiais, as pessoas tenderam a ficar mais em casa e estocar produtos, além de mudarem sua forma de consumo, e, em alguns mercados até de forma definitiva. O ano de 2020 foi atípico para o setor do agronegócio, o crescimento foi descontrolado comparado aos anos anteriores, “o PIB brasileiro referente ao agro fechou 2020 com expansão de 24,31% na comparação de 2019”, segundo Comunicado Técnico da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea).
Algumas programações realizadas em 2020 para embarques em 2021 afetaram drasticamente o resultado dos fornecedores no ano passado, já que eles tiveram que absorver 100% deste aumento. Diversos fornecedores que não conseguiram absorver esses aumentos, tentaram renegociar os contratos reajustando os valores, porém outros que não tiveram sucesso, infelizmente foram forçados a dar default em suas operações.
No cenário rodoviário não foi diferente, nas operações envolvendo a América Latina e mercado nacional, o aumento dos fretes tem sido constante, além das diversas greves nacionais e internacionais que prejudicam a chegada dos produtos. Este cenário é tanto do transporte da planta ao porto quanto da fábrica do fornecedor até o comprador. A alta inflação e o aumento do preço do diesel aumentaram o valor do frete mais do que o esperado. Como exemplo, tivemos casos na rota “Paraguai x Brasil” onde o frete rodoviário sofreu um reajuste de mais de 25% em comparação ao ano anterior, praticamente inviabilizando este tipo de operação.
Foi pensando nisso que os especialistas da Aboissa Commodity Brokers decidiram fazer uma entrevista com os nossos principais parceiros logísticos, entre eles agentes de carga, terminais portuários e transportadoras para entender um pouco melhor sobre a crise logística e quais são as perspectivas para 2022.
O INÍCIO DA CRISE
O principal fator que desencadeou a crise na logística internacional, não deve ser surpresa para ninguém, praticamente todos os entrevistados citaram a pandemia como a grande responsável, que logo causou um efeito dominó em toda a cadeia de produção.
Segundo Renata Coelho, diretora operacional da Columbus Logística Internacional: “Com o início da pandemia e dos lockdowns em diversos países do mundo, houve uma diminuição dos embarques em âmbito global. Por consequência disso, os armadores deixaram de comprar novos contêineres e suspenderam contratos de fabricação de navios. No entanto, poucos meses depois, com a mudança de hábitos de consumo em diversos países, em especial nos EUA, houve um aumento inesperado da demanda e os armadores não estavam preparados para isso”.

Todas as rotas marítimas foram impactadas nessa crise, algumas antes, outras depois. Os primeiros impactos foram os atrasos e a falta de espaço dos navios, seguidos pela falta de contêineres, e não demorou muito para que isso refletisse nos preços. Já no final de 2020 os armadores passaram a atualizar suas ofertas, mas foi em 2021 que este aumento atingiu em cheio o mercado. Para se ter uma ideia deste impacto, algumas de nossas rotas mais frequentes tiveram aumentos surpreendentes como no caso de Santos x Tunis onde o aumento no frete foi mais de 70%, já na rota Índia x Santos o aumento chegou a 150% e, nas exportações do Brasil para a América Latina especialmente para Peru, Colômbia e Equador o cenário piorou em 2021 onde o backlog (acúmulo de cargas) com os armadores só aumentou. Os navios operaram em média acima de 160% de suas capacidades e os armadores revisaram com frequência o GRI (General Rate Increase). A cada mês aumentava de USD 500 a USD 1.000 nos fretes para as Américas a fim de tentar segurar a lacuna entre o alto volume de cargas demandada e a redução nas ofertas de navio e contêiner. Essas altas excessivas dificultaram o equilíbrio do preço das commodities que, após um período de alta parecia buscar uma diminuição, porém sem sucesso, já que os fretes subiram mais do que a correção no preço dos produtos.
Todas as rotas foram afetadas nessa crise logística global, mas de acordo com Ian Petersen, General Manager na Bulkhaul Brasil duas se destacaram: a Norte Americana e a Asiática, sendo a China o carro chefe, que de tabela geraram o desbalanceamento global. Ainda segundo Ian, além destes fatores mencionados, existe o impacto que a pandemia causou nos serviços portuários, e que são igualmente importantes para a cadeia produtiva. Ele argumenta que “não é só a falta de navios ou de contêineres, e sim o “fica em casa” dos terminais portuários, motoristas de empilhadeiras, de caminhão (a infraestrutura de retaguarda teve um declínio de mão de obra disponível) não dando conta do aumento na demanda destes serviços tão importantes quanto navios e contêineres”.

Quando aplicado o cenário atual no ambiente rodoviário, podem haver algumas divergências quando comparados com outros modais. Conforme indica o André da empresa Rufatto Transportes, o mercado rodoviário não estava tão preparado para os efeitos da pandemia. Inicialmente, o frete rodoviário não se viu tão afetado quanto o marítimo, pelo contrário, o primeiro plano de ação de muitos produtores foi migrar para os caminhões. Com isso, a demanda aumentou, tendo apenas aumento de preço no frete por excesso de pedidos. Porém, agora a conta está chegando por motivos de escassez de insumos, prazos estendidos de fornecimentos, alta da inflação, entre outros fatores. Seguindo essa lógica, a Rufatto Transportes ainda ressalta que os fretes devem acompanhar o aumento dos insumos, maquinários, peças e afins. Este círculo não para por aí, pois com o aumento dos fretes, a tendência é o aumento do produto final, repassando os custos da operação à toda cadeia de distribuição até chegar ao consumidor final.
A REAÇÃO DOS ARMADORES
“Acho que pouca gente tinha noção do que estava por vir, do contrário teriam se preparado melhor. O mundo esperava uma desaceleração generalizada, porém o que temos visto é um aumento no consumo de bens materiais devido as sobras orçamentárias por redução no consumo de serviço”, diz Marcelo.
Por outro lado, os armadores estão aproveitando este momento do mercado para corrigir ofertas, se capitalizar e atualizar suas frotas, lembrando que já há algum tempo existe este movimento entre as gigantes marítimas de se juntar deixando o mercado cada vez com menos concorrência, conforme citou Jean Albuquerque, Latin America General Manager da Den Hartogh Logistics: “Foi algo anunciado, retiraram serviços em 2020, colocaram navios e contêineres para scrap (descarte), consolidaram rotas com outros armadores e por ser um oligopólio, a demanda é restrita e os fretes aumentaram por falta de concorrência”.
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“O problema é que agora os casos de covid estão ressurgindo, por esse motivo os portos operam com menos pessoal e menor capacidade para recebimento de navios e contêineres“ destacou Jean da Den Hartogh.
Outros parceiros entendem que é um momento importante para redução de lucros a fim de manter suas operações. Ian diz que em alguns momentos é necessário aguentar esses gargalos com redução de lucros para manter a balança, já que os custos aumentaram de maneira exponencial para todos os envolvidos.
Em alguns casos, vemos até mesmo uma mudança modal, como já citado pelos nossos parceiros Marcelo e Jean, sendo do marítimo para rodoviário; mudança de embalagens, etc.
Também é importante que as programações de embarques sejam cumpridas para garantir solidez para futuras negociações com armadores.
“Planejar e programar suas operações e estar próximo de seus parceiros. Vale também cumprir com as reservas submetidas aos armadores, pois estabilidade e constância são muito bem-vistas”, destaca Renata.
De acordo com grande parte de nossos entrevistados e informações de mercado, não é esperada uma rápida recuperação na logística internacional. As apostas estão apenas para depois do segundo semestre de 2022, mas não se tem uma visão em comum entre os diferentes players de mercado. O que observamos é um consenso de que o preço dos fretes tende a se estabilizar. Todo esse caos gerado não deve ser resolvido a curto prazo, pois depende de iniciativas que demandam tempo como ampliação de portos, fabricação de navios maiores e investimento em infraestrutura. Outro ponto é que para o setor logístico o mercado brasileiro representa apenas 1% da movimentação mundial de contêineres, logo já não somos a rota preferida dos armadores que por sua vez preferem o hemisfério norte que é mais rentável.
O mercado está cada vez mais interdependente e sensível às mudanças, pudemos observar essa relação com as greves, lockdowns e fatores climáticos em certas regiões que tiveram impactos globais, por exemplo, o travamento do canal de Suez que tornou mais grave a crise logística que já estávamos enfrentando. Um ponto positivo neste momento é a vacinação em massa que tem sido essencial para conter as restrições e a falta de mão de obra nos portos e terminais, aliviando a pressão logística.
Em suma, todas as incertezas vividas nos últimos dois anos levaram as empresas do ramo internacional a buscarem novas alternativas para se renovar e adaptar às adversidades causadas pela logística internacional: como abertura de mercados até então pouco explorados, substituição de produtos e busca de novos fornecedores e/ou parceiros comerciais e rotas alternativas. Citando alguns exemplos, nossos clientes buscaram novos fornecedores em países diferentes, e esse fenômeno pôde também ser visto em outros âmbitos como na substituição de modais de transporte (como o ferroviário, rodoviário e até substituir embarques em contêineres para granel) para fugir dos fretes inflacionados em algumas rotas. Diante dessas turbulências e em um cenário de tantas incertezas, as estratégias recomendadas aos importadores e exportadores é de planejamento de estoques e adiantarem as suas vendas para garantir o embarque, além disso, buscar alternativas como abrir novos mercados em rotas menos afetadas pela escassez de contêineres a fim de ampliar a possibilidade de negócios.
Por: Aboissa Commodity Brokers | Redação: Equipe Soft Oils da Aboissa | Revisão: Equipe Oleochemical Products da Aboissa
Contribuição e Agradecimento: Renata Coelho – Diretora Operacional da Columbus Logística Internacional, Matias Olmed – Customer Sales Executive da Inter-Tank Logistic Group, Jean Albuquerque – Diretor da Den Hartogh, Bulkhaul Brasil, Felipe Vasconcellos – CEO da Isis Transportes e Terminais, André Rufatto – Diretor da Rufatto Transportes e Logísticas e Marcelo Schaeffer – diretor de Negócios da Manuport Liquids do Brasil